Chico Buarque chega aos 80 anos com futebol permeando vida e obra

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Torcedor do Fluminense, criador do Politheama e companheiro de Bob Marley em jogo, cantor e compositor vive futebol desde a infância e traduz amor em canções e textos “Na Seleção brasileira de futebol de todos os tempos, Pelé, ao lado de Garrincha, é o único com lugar garantido no time titular. No escrete da música, Chico Buarque – que já foi considerado o sucessor de Noel Rosa – assim como Pelé, de Leônidas – também estaria em todas as listas de convocados para um embate fictício com qualquer das nações do mundo musical popular, seja Estados Unidos, Inglaterra ou Cuba”. 
Chico Buarque completa 80 anos nesta quarta-feira e é impossível pensar em Chico sem que o futebol esteja ali no cotidiano. A citação acima é de Beto Xavier, autor de “Futebol no país da música”, que dedica longas páginas para narrar o amor do cantor e compositor pelo esporte, pelo Fluminense, pelo Politheama, por Pagão (ex-Santos), por Pelé e Garrincha… Não só em canções Chico conseguiu se declarar ao jogo, mas em crônicas e livros.
Chico Buarque em jogo do Fluminense
Fluminense/Twitter
A paixão pelo futebol veio da mãe, Maria Amélia. Ela era torcedora do Fluminense e, em São Paulo, levava os filhos para ver o Flu em jogos no Pacaembu. Aos seis anos de idade, Chico se tornou Fluminense, pelo que contou à revista Status, em 1982. Foi em um jogo contra o Palmeiras, em que o time carioca perdeu por 3 a 1, mas ainda assim conquistou o coração do menino. Chico chegou a ir para teste no Juventus, na Rua Javari.
O pai Sérgio Buarque de Hollanda também reconheceu nele, desde menino, o amor por futebol e música. Ao compor “Bom Tempo”, em 1968, Chico lembrou-se de incluir “o radinho contando direito a vitória do meu tricolor”, em referência ao clube de coração.
Você não escolhe um time. Você escolhe um time por influência de alguém, ou para contrariar alguém. Fui levado por minha mãe, que era tricolor, e passei a torcer pelo clube. Ou você é ou não é. Sou tricolor, e acabou.
Chico Buarque em jogo do Fluminense
Marina Garcia/FFC
Garrincha, Mambembe FC, Politheama…
Quando foi para a Itália, no ano de 1969, o cantor e compositor afinou a amizade com outro craque brasileiro: Garrincha. Em Roma para acompanhar a turnê de Elza Soares, Garrincha se aproximou do cantor e compositor. E aí também, naquele país, Chico idealizou o “Ludopédio”, um brinquedo inspirado no futebol e que foi comercializado pela Grow, nos anos 1970.
Inscreveu-se como jogador no time do Mentana. Em 1972, em “Partido Alto”, mais uma vez o futebol aparece na “muita malícia pra correr atrás de bola e fugir da polícia”.
Foi ali perto de “Partido Alto” que Chico montou o primeiro time oficial dele: o Mambembe Futebol Clube. Mesmo em grande turnê, sempre conseguia um tempo precioso para jogar. Sob pseudônimo de Julinho da Adelaide (um drible de mestre nos censores da Ditadura), lançou “Jorge Maravilha”, citando o “Mengo”. Nos rádios do País, “Fio Maravilha” tomava conta, com Jorge Ben fazendo sucesso.
Futebol do Fluminense encantou até Chico Buarque
Em 1975, Chico joga no Maracanã em uma partida preliminar, com a camisa do Fluminense. Um sonho – daqueles – realizado. Depois lança a música “Pivete”, em parceria com Francis Hime, onde cita Pelé e Garrincha: “Zanza na sarjeta/Fatura uma besteira/E tem as pernas tortas/E se chama Mané”.
Em 1979, vem o campo do Politheama no Recreio dos Bandeirantes, time que o acompanhará, e que nasceu em 1978 nas cores azul e verde, com significado de “muito espetáculo”.
Jogo com Bob Marley e a canção “O Futebol”
Em 1980, uma famosa “pelada” agitou o campo do Politheama (também conhecido como Centro Recreativo Vinicius de Moraes), no Recreio dos Bandeirantes. Com a presença de ninguém menos que Bob Marley, em passagem pelo Brasil. Toquinho, Moraes Moreira e Alceu Valença também estavam presentes.
– Politheama era o time de botão do Chico, azul e verde, que ele fundou aos 15 anos – explicou à BBC a jornalista Regina Zappa, autora de Chico Buarque: Para Todos (1999) e Chico Buarque – Para Seguir Minha Jornada (2011).
Em 1984, quando Chico lança “Pelas Tabelas”, o Brasil já vivia o clima das Diretas Já. Num trecho da canção, aparece o Maracanã. Em campo, o Fluminense seria bicampeão carioca e conquistaria o Campeonato Brasileiro. Um feito e tanto.
“Quando vi um bocado de gente descendo as favelas
Eu achei que era o povo que vinha pedir
A cabeça de um homem que olhava as favelas
Minha cabeça rolando no Maracanã.”
Bob Marley jogando futebol com músicos brasileiros, entre eles Chico Buarque e Toquinho
Arquivo Pessoal
Em 1989, também escreve “O futebol”, em que une alguns dos ídolos: Mané, Didi, Pagão, Pelé e Canhoteiro. Em um show, brinca com Wilson das Neves, baterista que o acompanhava, como se jogassem futebol no palco.
– Já não vai tanto a estádio, mas joga três vezes por semana com os amigos. Durante as temporadas de shows, as partidas de futebol são parte integrante dos contratos – a tal ponto que ele e os músicos brincam, dizendo que estão ali jogando futebol, e, como sobra um tempinho, fazem shows – define Wagner Homem, em “Histórias das canções – Chico Buarque”.
Chico cronista e comentarista
Na Copa do Mundo de 1998, na França, Chico Buarque atuou como comentarista esportivo e escreveu crônicas para O Globo e O Estado de S. Paulo. No livro “Budapeste”, em 2004, dá nomes a alguns personagens de jogadores da seleção da Hungria de 1954. Puskás, por exemplo, está lá. Em 2005, Chico posou com a camisa do Politheama e Pelé.
– O Politheama é mesmo o templo sagrado de Chico e de toda uma legião de músicos e colaboradores, para usar um termo, digamos, empresarial. Ali, semanalmente, a confraria que mistura artistas, produtores e peladeiros adota o futebol como religião – resume Beto Xavier, em “Futebol no país da música”.
Wagner Homem, em “Histórias das canções – Chico Buarque”, lembra que jogadores famosos passaram pelo campo.
Foi no Politheama que Ronaldo, o Fenômeno, fez a sua primeira partida após cirurgia no joelho, e também a última antes de embarcar para a Copa do Mundo do Japão, em 2002.
Em 2007, Chico Buarque teve 26 minutos atuando ao lado de Figo, foi treinado por Luiz Felipe Scolari e enfrentou Zidane em partida beneficente organizada pelo craque português no estádio José Alvalade, em Lisboa. No mesmo ano, prestigiou uma “pelada” da fundação dos ex-jogadores Leonardo e Raí.
No álbum de 2011, ele grava “Barafunda”, com mais referências a Garrincha, Zizinho, Pelé, gol de bicicleta, tiro de meta… Em 2017, Jogo de Bola faz parte do álbum “Caravanas”.
Chico Buarque no campo do Politheama
Thaís Jorge
“Há que aplaudir o toque
O tique-taque, o pique, o breque, o lance
De craque do centroavante
E ver rolar a pelota nos pés de um moleque
É ver o próprio tempo num relance
E sorrir por dentro.”
Em 2023, acompanhou o Fluminense no Maracanã e se declarou à época: “Equipe está irresistível”. Chico chega aos 80 anos como um craque e ídolo de tantos.
Para ouvir: um “time” de músicas em que Chico lembra do futebol
Com Açúcar, com Afeto
Bom tempo
Partido Alto
Jorge Maravilha
Meu Caro Amigo
Jogo de Bola
Pivete
Pelas Tabelas
Biscate
Barafunda
O Futebol

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