Com “comissão técnica particular”, Gabi Nunes segue os passos de Vini Jr. e celebra melhor fase da carreira

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Inspirada no craque do Real Madrid, atacante da seleção feminina investe em preparação especial para evitar lesões e melhorar rendimento em campo O corte às vésperas da Copa América de 2022, devido a um edema na coxa, acendeu o alerta. Faltando um ano para a Copa do Mundo da Austrália e da Nova Zelândia, a atacante Gabi Nunes apostou em uma preparação especial para não colocar em risco seu primeiro Mundial. Montou uma comissão técnica particular e hoje colhe o resultado: além de não sofrer mais com lesões, a jogadora de 27 anos celebra a melhor fase da carreira.
Gabi Nunes comemora gol em Brasil x Argentina
Leandro Lopes / CBF
– Eu já tive lesões no passado, e depois que eu comecei a fazer essa preparação nunca mais tive problemas. A Copa América foi um gatilho pra mim, pensei: “Não posso mais perder momentos importantes na carreira, então vou começar a investir nessa parte” – contou Gabi Nunes em entrevista ao ge, antes de se apresentar à seleção feminina para os amistosos contra Jamaica neste sábado, em Recife, e no dia 4 de junho, em Salvador.
No início de 2023, quando ainda atuava no Madrid CFF, Gabi Nunes contratou um preparador físico, um fisioterapeuta e um analista de vídeo. Este ano, já no Levante, ela adicionou um coach especializado em futebol se juntou à sua “comissão técnica” particular. A inspiração de Gabi Nunes também joga na Espanha e veste a camisa da seleção, só que a masculina: Vinícius Júnior, atacante do Real Madrid.
– O futebol masculino tem muito isso, e no meu primeiro ano no Madrid CFF eu vi o Vinícius Júnior fazendo esse trabalho quando estive na casa dele. Eu vi a estrutura que ele tinha, e que isso fazia mesmo a diferença. Por isso, decidi buscar para mim também. Claro que a diferença de salário é grande, ele pode ter tudo em casa, tranquilo. Mas eu busquei a melhor forma de fazer, e isso foi muito importante para mim – afirmou a atleta, que investe cerca de 15% do salário na comissão particular.
O resultado se traduz em números. Gabi Nunes está terminando sua melhor temporada na carreira, com 15 gols pelo Levante. Dos sete gols que tem na seleção brasileira, quatro foram marcados após começar o trabalho adicional.
Na conversa com o ge, por videoconferência, de Valência, na Espanha, Gabi Nunes detalhou a preparação especial, relembrou a decepcionante Copa do Mundo da seleção brasileira ano passado e traçou planos para o futuro: o desejo de estar nas Olimpíadas de Paris e o sonho de jogar o Mundial de 2027 no Brasil.
Gabi Nunes comemora um gol pelo Levante, da Espanha
Twitter/Levante Feminino
Vamos começar falando de Copa do Mundo. O que achou da escolha do Brasil como sede da próxima edição, em 2027?
No momento que eu soube foi uma alegria muito grande. Por causa do fuso, era de madrugada aqui na Espanha, então eu só fiquei sabendo no dia seguinte, quando acordei. É um sonho não só para mim, mas para todas aquelas jogadoras que já encerraram a carreira. É uma oportunidade de jogar em seu país, com apoio da torcida, e desenvolver o futebol feminino. A gente sabe que a Copa do Mundo em outros países foi um sucesso e ajudou a desenvolver a modalidade. A visibilidade vai estar no Brasil. Espero poder jogar, mas tem um tempinho aí para a frente. Hoje eu vivo o meu melhor momento aqui na Europa, então eu tenho isso em mente, porque eu sempre me cuidei bem, e tenho esses três anos para tentar uma vaguinha para minha segunda Copa do Mundo.
Ano passado, você atuou pouco, entrou apenas no segundo tempo contra o Panamá, na estreia. E quase fez um golaço em jogada individual, mas preferiu tentar o passe em vez de chutar. Ainda pensa naquele lance?
O que eu mais escutei depois das meninas foi que eu devia ter chutado. No momento, eu pensei mesmo em chutar, mas acabei passando a bola. Mas prefiro ficar com os bons momentos daquele jogo, nós ganhamos, foi uma ótima estreia. A gente já vinha de jogos bons, ganhamos da Alemanha (em amistoso preparatório) e chegamos confiantes para a Copa. A gente estava bem feliz, unido, todo mundo centrado para buscar o título, mas as coisas não saíram como a gente imaginou. Foi bem frustrante quando a gente não se classificou para as oitavas. A gente via no rosto de cada menina. Foram meses de preparação para chegar da melhor forma, taticamente, fisicamente e emocionalmente, e no momento em que a gente não conseguiu foi quando veio o baque para todo mundo. A gente ficou muito, muito triste.
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Quase um ano depois, já é possível entender o que aconteceu com o Brasil naquela Copa?
Depois que acabou o jogo com a Jamaica, a gente foi para o hotel e foi um momento de reflexão para todas. O que aconteceu? Talvez a gente ganhe da Jamaica agora e vai ficar esse questionamento, por que não ganhou antes? Futebol é detalhe. Contra a Jamaica, a gente só precisava de um gol. Estava todo mundo muito bem, taticamente sempre nos mostravam o melhor caminho, e emocionalmente estava todo mundo totalmente feliz, disputando uma Copa do Mundo. No momento em que as coisas saíram do controle, por causa desses detalhes, foi ali que a gente viu como pesa. Agora temos as Olimpíadas, muitas jogadoras podem ir de novo, outras não, mas tenho certeza de que vamos levar isso que acontece para as Olimpíadas. Cada detalhe é importante, cada feedback, se é para fazer, então tem que fazer. Às vezes a diferença pode ser um gol, como foi para a gente, um gol que faltou.
Ficou frustrada por não ter entrado contra a Jamaica, já que você é exatamente uma jogadora de área, uma finalizadora?
De verdade, fiquei bem frustrada, não por não ter sido escolhida para entrar, mas por não ter tido a oportunidade de ajudar. Qualquer jogadora quer ajudar, seja com um passe, um carrinho, uma marcação. Estávamos tendo muitas bolas na área e eu tenho essa especialidade, eu via que podia ter a chance de ajudar. Eu me preparei muito para essa Copa do Mundo, contratei e ainda tenho profissionais que me ajudaram a chegar da melhor forma possível na Copa. Eles ainda estão comigo me ajudando, se Deus quiser para mais uma Copa e para as Olimpíadas. Eu estava ali aquecendo, olhando o cronômetro e me agoniando cada vez mais. Na hora que apitou (o fim do jogo), veio o desabafo. Acho que fiquei umas cinco horas chorando.
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Depois da Copa, houve a troca da comissão técnica. Como tem sido essa transição?
A Pia (Sundhage) teve a sua oportunidade, e tenho certeza de que nós jogadoras aprendemos muito com ela. Treinadores vão acertar e vão errar, essa é a vida, não é fácil tomar as decisões na hora. Cabe aos treinadores decidir, e nós jogadoras escutamos e tentamos fazer o melhor dentro de campo. Treinei com o Arthur (Elias) no Corinthians, quando eu tinha 17 anos, são filosofias de trabalho diferentes. Pia vem do futebol europeu, ela nos ensinou bastante defensivamente, aprendemos muitas coisas, sim. O Arthur já traz aquela alegria dentro de campo que a gente tinha, o drible, o improviso, além claro da parte tática. Ele traz isso, esse gosto de defender a camisa da Seleção. Tenho certeza de que agora nas Olimpíadas ele vai poder implementar ainda mais o que ele realmente quer fazer, porque muitas vezes nos amistosos a gente acaba não fazendo tanto, até para não mostrar para os adversários. Nas Olimpíadas, ele vai ter uma coisa já definida e planejada para buscar esse título que ele tanto quer, e a gente também.
Você já está há quase um ano e meio fazendo um trabalho de preparação especial. Como é a sua rotina?
Eu tenho um preparador físico, faço um cuidado a mais com a musculação, para melhorar movimentos e não ter lesão. Tenho um fisioterapeuta que eu vejo uma vez por semana, às vezes a cada 15 dias, para fazer um tratamento, uma soltura, ou quando tem alguma dorzinha. Com o analista de vídeo, toda vez que eu vou jogar ele me manda características individuais das defensoras que eu vou enfrentar, o que eu posso fazer para furar o bloqueio da defesa, o que eu posso usar a meu favor. E, depois dos jogos, ele me mostra o que eu fiz em campo e onde eu posso melhorar. Também tenho um coach, um psicólogo do futebol, que também é importante. Não é fácil jogar fora do seu país, longe da família, e a gente acaba passando por muitas coisas e tem que estar com a cabeça muito forte. Eu tenho todo esse preparo com esses profissionais para poder estar 100% dentro de campo, porque isso é muito importante.
Agora, o Brasil vai enfrentar a Jamaica nos últimos amistosos antes da convocação para as Olimpíadas. Mas o Arthur Elias já avisou que tem uma lista de mais de 30 jogadoras para tirar as 18 que vão a Paris. A concorrência é forte, não?
Eu estou muito feliz de ter sido convocada para esses amistosos, estar na convocação nos ajuda a ter mais uma oportunidade de mostrar o que a gente sabe dentro de campo para ter essa vaga tão sonhada nas Olimpíadas. Eu estou empolgada porque os jogos não ser no Brasil, é sempre especial jogar com a torcida, enfrentar uma grande equipe, ter a oportunidade de se preparar para as Olimpíadas e começar a sentir esse gostinho. E ver minha família também um pouquinho, tenho certeza de que vai ser especial. Claro que não sabemos ainda quem vai para as Olimpíadas, como o Arthur falou, o leque está grande, e a decisão dele eu tenho certeza de que vai ser muito difícil, porque todas as jogadoras estão no seu melhor momento, dando o seu melhor nos clubes para ter essa vaguinha. Eu espero aproveitar da melhor forma possível, independentemente de quantos minutos eu jogar, para o time sair com a vitória.
Expresso da bola: Um bate-papo sobre carreira e Copa com Gabi Nunes

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