De Andreas e Galeno a Diego Costa e Jorginho, Seleção revive dilema da dupla cidadania; entenda regras

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Convocados por Dorival Júnior não titubearam apesar de serem elegíveis para Bélgica e Portugal, mas o Brasil já perdeu talentos para rivais. Fifa fez mudanças em lei que segue interpretativa Uma realidade cada vez mais comum no mundo globalizado e que coloca novamente jogadores da seleção brasileira frente a frente com o dilema: qual país defender?
Para Andreas Pereira e Galeno, a resposta foi imediata, até certo ponto óbvia, mas nem sempre foi assim. Nomes como Diego Costa, Jorginho, Thiago Alcântara e Thiago Motta abraçaram outras cores e fizeram valer um regulamento que passou por atualização da Fifa em 2020. Afinal, quando é que um jogador pode preferir jogar por um país diferente do que nasceu? E quando ele pode trocar de seleção? O ge ajuda a explicar.
Andreas Pereira em treino da Seleção Brasileira em Londres
Pedro Martins / Foto FC
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Convocados por Dorival Júnior para os amistosos contra Inglaterra e Espanha, Andreas e Galeno facilitam a compreensão do conceito de elegibilidade, uma vez que apresentam características distintas. O meia do Fulham nasceu na Bélgica, mas é filho de pais brasileiros. Por isso, podia escolher entre os dois países. Enquanto o atacante do Porto nasceu no interior do Maranhão e ganhou cidadania portuguesa pelo longo período em que joga em terras lusitanas.
O regulamento da Fifa apresenta as seguintes opções para dupla cidadania:
O jogador nasceu no território da associação.
A mãe ou pai biológico do jogador nasceu no território da associação.
A avó ou avô do jogador nasceu no território da associação.
O jogador mora no território da federação há pelo menos cinco anos.
Uma vez naturalizado, o jogador está apto a defender qualquer um dos dois países que tem passaporte e a situação se torna mais fácil quando não há dúvida ou disputa entre duas seleções. Em muitos casos, por mais que o atleta tenha destaque em determinado cenário, a escolha fica fácil quando a concorrência não apresenta oportunidades e não são poucos os casos de brasileiros que defenderam outros países sem sequer serem especulados pela Seleção.
Emerson Palmieri (número 13) e Jorginho (número 8) posam com o resto da seleção da Itália
Getty Images
Campeões europeus pela Itália em 2021, Rafael Tolói, Emerson Palmieri e Jorginho são bons exemplos. Os dois primeiros chegaram a ser convocados e disputaram competições oficiais pelas seleções de base do Brasil, mas passaram longe de um chamado para a principal e não titubearam ao convite da Azzurra. A situação de Jorginho é ainda mais marcante, uma vez que já se profissionalizou em terras italianas e acabou se tornando protagonista do título da Euro.
Há também o exemplo dos irmãos Alcântara, que tomaram rumos opostos. Filhos do tetracampeão Mazinho, Thiago e Rafinha nasceram na Europa e tinham o direito de escolher entre Espanha e Brasil. Destaque nas categorias de base da Fúria, o mais velho optou pelo país onde cresceu (apesar de ser nascido na Itália), enquanto o mais novo ficou com o verde e amarelo e foi campeão olímpico no Rio.
Thiago Alcântara em ação pela Espanha
Kiko Huesca/EFE
A regra da Fifa não limita a troca de federação para quem tiver oportunidade nas categorias de base, mas impõe limites a partir da profissionalização. Em congresso técnico realizado em setembro de 2020, a entidade estabeleceu novos parâmetros para esse tipo de situação com itens que permitem interpretações distintas a serem avaliadas por um comitê especial. Alguns pontos, por sua vez, são bem objetivos.
Um jogador que entrar em campo em grande competição, por exemplo, não pode mais trocar de seleção. São os casos da Copa do Mundo e disputas continentais, como Euro, Copa América, Copa Asiática ou Copa Africana de Nações. Para jogos oficiais que não sejam referentes a essas competições, porém, há maior flexibilidade para atletas até 21 anos.
Neste caso, o jogador pode disputar até três partidas em disputas de eliminatórias ou eventuais competições que venham a ser criadas, como era, por exemplo a Copa das Confederações. Especialista em Fifa, Felipe Amaral, advogado do escritório Bichara e Motta, explica a lei e suas nuances:
“A FIFA estabelece que o jogador precisa ter a nacionalidade permanente de um país, seja nato ou naturalizado, para que possa representar a respectiva seleção. E, caso já tenha atuado por um país em uma competição oficial, há poucos cenários bem definidos que permitem ao jogador trocar de seleção. Em linhas gerais, ao atuar em competição oficial de base, o jogador pode trocar de seleção se já tinha a nacionalidade de sua nova seleção à época dessa primeira atuação, ou, caso a obtenha posteriormente, se tinha até 21 anos quando da última atuação em competição oficial pela seleção anterior. Por outro lado, se atuar em competição oficial por seleção principal, o jogador somente pode trocar de país se já tinha a nacionalidade de sua nova seleção à época dessa primeira atuação, tinha menos de 21 anos quando da última atuação em competição oficial pela seleção anterior, pela qual não pode ter atuado em nível principal por mais de 3 partidas, e mais de 3 anos se passaram desde sua última atuação pela seleção anterior. De qualquer forma, são situações bem específicas que são analisadas pela FIFA, que autoriza ou não essa troca de seleções, o que só pode ocorrer uma vez para cada atleta”
Diego Costa defendeu a Seleção em 2013
Mowa Press
Felipe Amaral trabalha em um artigo sobre o tema, que tem como foco a seleção marroquina, que chegou às semifinais da última Copa do Mundo com um time quase completo não nascido no país e agora recebeu o “sim” de Brahim Díaz, do Real Madrid, nascido em Málaga, na Espanha. As variantes do regulamento, por sua vez, escancaram que cada vez mais os casos serão avaliados individualmente, principalmente se houver a decisão por mudança de país.
Na percepção do advogado, Galeno seguirá elegível para Portugal mesmo que entre em campo nas partidas contra Inglaterra e Espanha apesar de já ter 26 anos. O princípio do argumento é o fato de se tratar de jogos amistosos e não ultrapassar o limite de três imposto pela Fifa. O jogador e seus empresários têm a mesma interpretação.
O atacante do Porto nasceu em Barra do Corda, Maranhão, e está no país desde 2016 e em 2022 passou a ter dupla nacionalidade. A opção pelo Brasil, no entanto, foi imediata ao receber contato telefônico de Dorival Júnior, mesmo com o assédio do técnico Roberto Martinez, que pediu auxílio ao comandante portista Sérgio Conceição.
Galeno em treinamento da Seleção nesta segunda-feira em Londres
Rafael Ribeiro / CBF
Quem viveu situação similar a de Galeno em 2013 foi Diego Costa. Em alta no Atlético de Madri e no radar da Espanha, o atacante foi convocado por Luiz Felipe Scolari para amistosos contra Itália e Rússia em março daquele ano e entrou no decorrer das duas partidas, somando 33 minutos em campo. A ausência na Copa das Confederações, por sua vez, fez com que aceitasse o convite da Espanha, país por qual jogou as Copas de 2014 e 2018.
Na época, porém, não existia a limitação de três partidas imposta em setembro de 2020 e nem mesmo a idade de 21 anos, o que tornou o caso de mais fácil solução e compreensão. Quem passou por situação similar ao ser chamado por Tite, mas sequer cogita trocar de camisa é Andreas Pereira.
Andreas Pereira comenta sonho de jogar pela Seleção Brasileira: “Vou lutar até o fim”
Nascido na Bélgica, o meia foi procurado pela federação do país no início da temporada, mas sequer deu brecha para negociação e agora recebeu nova oportunidade com Dorival:
“Sou brasileiro, minha família é brasileira, e jogar em uma seleção só para dizer que joguei na seleção não faz sentido nenhum”
Com Andreas e Galeno decididos a vestir amarelo, o Brasil encara a Inglaterra, sábado, às 16h (de Brasília), em Wembley, em amistoso. No domingo, a seleção viaja para Madrid, onde mede forças com a Espanha, terça-feira, no Santiago Bernabeu.

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