Entenda como sangue contaminado de prisões nos EUA causou a morte de 3.000 pessoas no Reino Unido; relatório revela crise nos anos 1980

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Essa história é considerada o problema mais fatal do serviço público de Saúde do Reino Unido, que existe desde 1948. Acredita-se que cerca de 3.000 pessoas morreram em decorrência dessa crise. Ativistas fazem campanha no Reino Unido para que governo reconhecesse problema de sangue contaminado
Aaron Chown/AP
O governo do Reino Unido publicou um relatório na segunda-feira (20) sobre o que aconteceu para que 30 mil pessoas tenham contraído os vírus do HIV ou hepatite por transfusão de sangue ou de produtos sanguíneos contaminados durante os anos 1970 e 1980.
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Nessas décadas, o país importou derivados de sangue dos Estados Unidos, onde havia uma política para remunerar as pessoas pelo sangue. Muitos prisioneiros e usuários de drogas faziam isso para receber dinheiro. Além disso, o Reino Unido não tomou obrigatórios os procedimentos que poderiam tornar as transfusões seguras (leia mais abaixo).
Essa história é considerada o problema mais fatal do serviço público de Saúde do Reino Unido, que existe desde 1948. Acredita-se que cerca de 3.000 pessoas morreram em decorrência dessa crise.
No relatório, há críticas a profissionais de saúde, servidores públicos e políticos. Muitos deles já morreram. Esse documento também deve ser usado na Justiça para que o governo pague compensações.
O primeiro-ministro britânico, Rishi Sunak, afirmou que o resultado do relatório deveria mexer profundamente com o país e que as instituições falharam de uma forma devastadora.
Sangue foi importado dos EUA e material vinha de prisões
Nos anos 1970 e 1980, milhares de pessoas que precisaram de transfusões de sangue foram expostas a sangue contaminado com HIV e hepatite (incluindo um tipo de infecção hepática até então desconhecida, que mais tarde foi denominada hepatite C).
Os pacientes hemofílicos (uma condição que afeta a capacidade de coagulação do sangue) passaram a receber um produto derivado de plasma sanguíneo chamado Fator VIII.
Esse novo tratamento foi incorporado pelo sistema público de saúde.
A demanda por esse derivado de sangue superou rapidamente a oferta doméstica, então o Reino Unido começou a importar Fator VIII dos Estados Unidos.
Nos EUA, grande parte do plasma vinha de prisioneiros e de usuários de drogas que recebiam dinheiro pelo sangue. Isso aumentou drasticamente o risco de o material estar contaminado.
O Fator VIII era feito misturando plasma de milhares de doações. Nesse processo de mistura, um doador infectado comprometia todo o lote.
Evidências ignoradas
Em meados dos anos 1970 já havia evidências de que hemofílicos tratados com Fator VIII eram mais propensos a hepatite.
A Organização Mundial da Saúde, que havia alertado em 1953 sobre os riscos de hepatite associados à mistura de produtos plasmáticos, pediu para que os países não importassem plasma.
A Aids foi reconhecida pela primeira vez no início dos anos 1980 entre homens gays, mas logo começou a aparecer entre hemofílicos e aqueles que haviam recebido transfusões de sangue.
Embora o HIV não tenha sido identificado como a causa da AIDS até 1983, alertas foram enviados ao governo do Reino Unido no ano anterior, indicando que o agente causador poderia ser transmitido por produtos sanguíneos. O governo argumentou que não havia provas conclusivas. Os pacientes não foram informados do risco e continuaram a usar um tratamento que os colocava em perigo de vida.
Ativistas argumentam que desde os anos 1940 já estava claro que o calor matava a hepatite em outro produto plasmático (albumina). Ou seja, dizem eles, o Fator VIII poderia passar por um processo para que fosse seguro, mas as autoridades não tornaram isso obrigatório.
Evidências apresentadas à investigação sugerem que as autoridades não quiseram fazer isso porque os custos aumentariam. O Fator VIII não aquecido foi prescrito pelo sistema público de saúde do Reino Unido até o final de 1985.

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