Até início de maio, Brasil usou apenas 19% do orçamento anual para combater desastres naturais, diz levantamento

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Até o dia 2 de maio, havia sido empenhado cerca de um quinto dos R$ 2,6 bilhões previstos para o ano inteiro. Uso da verba é condicionado ao envio de projetos por prefeituras ou deputados federais. Gastos com obras emergenciais superam ações de prevenção. Mulher é resgatada em Porto Alegre por conta de enchentes das cheias do Guaíba
Diego Vara/Reuters
Até o último dia 2 de maio, o Brasil havia usado apenas 19% dos R$ 2,6 bilhões previstos no Orçamento da União para prevenção e combate a desastres naturais em 2024. É o que mostra um levantamento da associação Contas Abertas. O repasse dessa verba pelo governo federal é condicionado ao envio de projetos por prefeituras ou deputados federais.
O documento (detalhado abaixo) também revela que gastos com obras emergenciais – ou seja, ações de remediação a desastres naturais – superam ações de prevenção.
“Vivemos uma situação que chega a ser paradoxal. Essas tragédias se repetem todos os anos, mas os recursos destinados ao enfrentamento não são sequer gastos em sua totalidade”, afirma ao g1 Gil Castello Branco, diretor-presidente da associação Contas Abertas.
De acordo com o economista, de 2010 a 2024 foram autorizados, no acumulado de orçamentos anuais da União, R$ 70 bilhões para o enfrentamento a fenômenos climáticos. No entanto, dados do levantamento histórico apontam gasto efetivo de apenas 65% desse total.
“Os ministérios alegam que não chegam a Brasília projetos que deveriam ser encaminhados pelos municípios”, explica Gil Castello Branco, que também alerta para a dificuldade que as prefeituras podem enfrentar para apresentar projetos mais complexos.
“É natural que prefeituras de pequeno e médio porte não tenham, nos seus quadros técnicos, engenheiros capazes de desenvolver projetos de contenção de encostas, de dragagem de rios, ou mesmo projetos habitacionais para a remoção de pessoas que habitam as áreas de riscos.”
Enchentes no RS
Mais de 80% dos municípios do Rio Grande do Sul foram afetados pelas enchentes que deixaram mais de cem de mortos e pelo menos 230 mil pessoas desabrigadas. O estado tem 336 cidades em situação de calamidade, inclusive as mais populosas, como a capital, Porto Alegre.
Na bancada gaúcha no Congresso, apenas uma parlamentar destinou, em 2024, emendas para a prevenção de desastres climáticos no Rio Grande do Sul.
A situação no estado não é uma exceção. O levantamento feito pelo Contas Abertas mostra também que foi empenhado (utilizado) apenas R$ 1 milhão dos R$ 59,2 milhões em emendas parlamentares indicadas para ações relacionadas a prevenção e recuperação de desastres em 2024. Para fins de comparação, o total autorizado para emendas parlamentares no ano – em todo o Brasil e para qualquer finalidade – foi de R$ 44 bilhões.
Gastos com recuperação superam prevenção
De acordo com Castello Branco, os programas orçamentários tendem a gastar mais com respostas a desastres do que com prevenção.
“Dos R$ 2,6 bilhões [detalhados na imagem abaixo] autorizados, cerca de R$ 1,5 bilhão é previsto para ações de proteção e Defesa Civil. É o maior valor dentre todas as ações orçamentárias”, explica.
“É difícil, hoje em dia, saber exatamente quanto está sendo destinado à prevenção e à recuperação. Neste ano, vai ser enormemente maior na recuperação, diante do que aconteceu com o Rio Grande do Sul.”
Programas e ações diretamente relacionados à prevenção e à recuperação de desastres
Contas Abertas
Entre 2018 e 2024, o governo federal investiu sete vezes mais em ações de socorro. O investimento em ações de reconstrução foi de R$ 7 bilhões, ante R$ 2,7 bilhões em ações de prevenção.
Segundo Castello Branco, o desastre climático deve obrigar um plano de reconstrução completa do Rio Grande do Sul.
“Daí a importância de estarem imaginando créditos extraordinários que só acontecem quando há realmente a tragédias imprevisíveis como uma guerra ou uma calamidade, como aconteceu na época da pandemia.”
Posição do governo
Além dos R$ 2,6 bilhões previstos no Orçamento, o governo Lula anunciou nesta semana um pacote de R$ 1,7 bilhão para contenção de encostas e R$ 4,8 bilhões para drenagem urbana (sistema de captação e destinação de água das chuvas). Os projetos fazem parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
“O Ministério da Integração é aquele que passa a maior parte das verbas desses programas, [mas] não é o único”, explica Castello Branco. Segundo ele, a pasta é a que repassa mais recursos relacionados a programas de prevenção e de resposta aos desastres.
Em 2 de maio, em comunicado oficial, o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR) afirmou que as cidades gaúchas que não tinham recebido recursos precisavam apresentar planos de trabalho.
“As cidades gaúchas que ainda não receberam os recursos precisam apenas apresentar os planos de trabalho ao MIDR. Todos os recursos solicitados estão garantidos e prontos para o repasse”, diz o documento, publicado no portal gov.br.
No mesmo comunicado, Wesley Felinto, chefe de gabinete da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil do MIDR, diz que “basta que os municípios atingidos entrem no sistema da defesa civil, apresentem um plano de trabalho, que é simples, feitos com fotos georreferenciadas, com custo estimativo, podendo solicitar a recuperação de pontes, unidades residenciais destruídas, pontes, toda a infraestrutura pública”.
Em coletiva de imprensa realizada nesta sexta-feira (10), o governo informou que a Defesa Civil Nacional havia aprovado, até a manhã do dia 10/05, 87 novos planos que somam quase R$ 56 milhões em recursos. Outros 93 planos estão em avaliação.
Além disso, o governo aprovou o repasse de uma verba emergencial para cidades atingidas pelos temporais. O texto prevê destinação facilitada de verbas conforme o tamanho da cidade que as solicita, sendo:
R$ 200 mil para municípios com até 50 mil habitantes;
R$ 300 mil para municípios com população entre 50 mil e 100 mil;
R$ 500 mil para municípios com população acima de 100 mil.
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