Bolsonaro indiciado pela PF: relembre ponto a ponto a investigação sobre falsificação de cartões de vacina

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Inquérito concluiu que ex-presidente e auxiliares dele foram responsáveis pela inclusão de informações falsas no sistema ConecteSUS. Caso seguirá para análise do Ministério Público. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)
Adriano Machado/Reuters
A Polícia Federal indiciou nesta terça-feira (19) o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 16 pessoas por um esquema de falsificação de cartões de vacina. Segundo os investigadores, o grupo incluiu informações falsas em um sistema do Ministério da Saúde, para beneficiar o ex-presidente, parentes e auxiliares dele.
A investigação veio a público em maio de 2023, quando a Polícia Federal deflagrou uma operação para cumprir 16 mandados de busca e apreensão e seis de prisão, contra investigados. A ação foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
Com o indiciamento, o processo segue para análise do Ministério Público Federal (MPF), que vai decidir se apresenta ou não denúncia contra os indiciados.
Entenda pontos da investigação da PF que levou a buscas na casa de Bolsonaro
Relembre abaixo os principais pontos da investigação:
▶️ Contexto: a operação foi autorizada por Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das milícias digitais.
Segundo as investigações, um grupo ligado a Bolsonaro inseriu informações falsas no ConecteSUS para obter vantagens ilícitas.
O objetivo do esquema era obter certificados de vacinação contra a Covid-19.
A PF identificou que as informações falsas foram colocadas nos sistemas do Ministério da Saúde poucos dias antes de Bolsonaro viajar para os Estados Unidos, em dezembro de 2022.
O ex-presidente afirma que não se vacinou contra a doença.
À época, os Estados Unidos exigiam comprovante de imunização contra a Covid-19 para que estrangeiros entrem no país.
Confira detalhes do suposto esquema mais abaixo.
▶️ Certificados de vacinação: de acordo com o inquérito, foram forjados dados de vacinação de pelo menos sete pessoas. São elas:
O ex-presidente Jair Bolsonaro;
A filha de 12 anos de Bolsonaro;
Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
A mulher e as três filhas de Mauro Cid.
▶️ Resumo da operação: em 3 de maio de 2023, a PF cumpriu seis mandados de prisão e outros 16 mandados de busca e apreensão, em Brasília e no Rio de Janeiro.
Jair Bolsonaro foi alvo de um mandado de busca e apreensão e teve o celular apreendido.
O STF também determinou a apreensão do passaporte de Bolsonaro. Na data, a PF informou que o documento não foi apreendido. No entanto, acabou retido em fevereiro de 2024, em outra operação, que investiga tentativa de golpe de Estado.
Mauro Cid, que é ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e outras cinco pessoas foram presas.
Na casa de Cid, a PF encontrou notas de dólares, que somaram US$ 35 mil, além de R$ 16 mil em dinheiro vivo.
Após a operação, Bolsonaro disse que não tomou vacina e que não houve adulteração nos registros de saúde dele e da filha.
Bolsonaro e seu então ajudante de ordens Mauro Cid em 2019
Adriano Machado/Reuters
Alvos da operação
Dezesseis pessoas foram alvos da operação. Ao todo, a Justiça expediu 22 ordens judiciais, que foram cumpridas pela PF.
▶️ Quem foi preso na operação? Confira, a seguir, a lista dos alvos de mandado de prisão:
o coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro;
o sargento Luis Marcos dos Reis, que era da equipe de Mauro Cid;
o ex-major do Exército Ailton Gonçalves Moraes Barros;
o policial militar Max Guilherme, que atuou na segurança presidencial;
o militar do Exército Sérgio Cordeiro, que também atuava na proteção pessoal de Bolsonaro;
o secretário municipal de Governo de Duque de Caxias (RJ), João Carlos de Sousa Brecha.
Todos foram soltos em setembro de 2023. Mauro Cid foi liberado em 9 de setembro, após fechar acordo de colaboração premiada com a PF. As informações prestadas por ele auxiliaram nas investigações sobre tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
▶️ Quem foi alvo de buscas? Veja, abaixo, a lista de pessoas que foram alvo de mandados de busca e apreensão:
Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
Mauro Cesar Cid, tenente-coronel, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
Gabriela Santiago Ribeiro Cid, esposa de Mauro Cid;
Gutemberg Reis de Oliveira, deputado federal pelo MDB-RJ;
Luís Marcos dos Reis, sargento do Exército, ex-integrante da equipe de Mauro Cid;
Farley Vinicius Alcântara, médico que teria envolvimento no esquema;
João Carlos de Sousa Brecha, secretário de Governo de Duque de Caxias (RJ);
Max Guilherme Machado de Moura, segurança de Bolsonaro;
Sergio Rocha Cordeiro, segurança de Bolsonaro;
Marcelo Costa Câmara, assessor especial de Bolsonaro;
Eduardo Crespo Alves, militar;
Marcello Moraes Siciliano, ex-vereador do RJ;
Ailton Gonçalves Moraes Barros, candidato a deputado estadual pelo PL-RJ em 2022;
Camila Paulino Alves Soares, enfermeira da prefeitura de Duque de Caxias;
Claudia Helena Acosta Rodrigues da Silva, servidora de Duque de Caxias;
Marcelo Fernandes de Holand.
Quem é Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro preso em operação da PF
Como funcionou o suposto esquema
As investigações afirmam que os dados falsos foram incluídos no sistema do Ministério da Saúde em dezembro de 2022. Com isso, segundo a PF, os suspeitos conseguiram emitir certificados de vacinação para burlar restrições sanitárias.
▶️ Como tudo começou: a primeira tentativa de burlar o certificado de vacinação teria acontecido em novembro de 2021, de acordo com a investigação. À época, o coronel Mauro Cid queria obter um documento para a esposa, Gabriela Cid, conforme o inquérito.
Cid teria pedido ajuda para Luís Marcos dos Reis, sargento do Exército que integrava a equipe do coronel na Presidência da República. Reis, então, teria acionado o sobrinho Farley Vinicius Alcântara, que é médico, para conseguir o documento.
O sargento teria retornado para Cid um documento digitalizado de um cartão físico de vacinação, que possui o carimbo e assinatura de Farley. A dose teria sido aplicada em Cabeceiras (GO).
A PF verificou com o Ministério da Saúde que não há registros de aplicação de doses no nome da mulher de Cid na unidade de saúde de Cabeceiras.
Para inserir os dados no ConecteSUS, Cid teria pedido ajuda para o militar Eduardo Crespo Alves.
As investigações apontam que Crespo tentou fazer a operação no Rio de Janeiro, mas teve dificuldades, já que o lote que Farley havia informado no cartão de vacinação não havia sido distribuído ao estado, e o sistema do SUS entendeu como “fraude”.
Para contornar o problema, Cid e Reis teriam pedido a Farley um novo cartão de vacinação, em branco, para que eles conseguissem preencher com lotes de vacinas distribuídos no Rio de Janeiro.
Cid também teria acionado Ailton Gonçalves Moraes Barros para pedir ajuda e conseguir um cartão de vacinação emitido por Duque de Caxias (RJ).
Ailton teria feito uma conta na plataforma “GOV.BR” no nome da esposa de Cid. Depois, segundo a PF, os dados de vacinação foram inseridos no sistema com o intermédio do ex-vereador Marcello Moraes Siciliano.
Conforme as investigações, o sistema consta que os dados da esposa de Cid foram incluídos no sistema por Camila Paulino Alves Soares.
A PF descobriu também que os nomes de Mauro Cid e das três filhas dele aparecem como vacinadas em Duque de Caxias, o que causou estranheza, já que a família mora em Brasília.
Segundo a PF, os dados foram incluídos no sistema por João Carlos de Sousa Brecha, que era secretário municipal de Duque de Caxias, em dezembro de 2022.
▶️ Cartão de Bolsonaro, família e funcionários:
De acordo com a PF, os dados de vacinação do ex-presidente foram incluídos no sistema do Ministério da Saúde em Duque de Caxias, mesma cidade onde Cid teria conseguido o cartão de vacinação da esposa.
As investigações identificaram que os dados das doses do ex-presidente foram colocados no sistema por João Carlos de Sousa Brecha, secretário de Governo de Duque de Caxias.
Lembrando que Brecha foi identificado pela PF como responsável por preencher dados de vacinação de Cid e das filhas do coronel no sistema do SUS.
A PF descobriu que Brecha também fez a operação no nome da filha do ex-presidente.
As vacinas de Bolsonaro teriam sido aplicadas no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias, nos dias 13 de agosto e 14 de outubro de 2022.
Além disso, o inquérito identificou que Max Guilherme Machado de Moura e Sergio Rocha Cordeiro, nomeados seguranças de Bolsonaro em 26 de dezembro do ano passado, também apareciam no sistema do Ministério da Saúde como vacinados no mesmo local que Bolsonaro, em agosto e outubro de 2022.
Todos os dados teriam sido preenchidos por Brecha no dia 22 de dezembro de 2022, portanto, meses depois das supostas aplicações das vacinas.
No dia 27 de dezembro de 2022, a servidora Claudia Helena Acosta Rodrigues da Silva excluiu do sistema os dados de vacinação de Bolsonaro e da filha do ex-presidente, segundo o inquérito.
Jair Bolsonaro fala após operação da PF sobre fraudes em cartões de vacinação
Adriano Machado/Reuters
A investigação
Além dos indícios no próprio sistema do Ministério da Saúde, a investigação obteve trocas de mensagens entre alguns dos envolvidos que confirmaram a fraude – a quebra do sigilo foi autorizada pela Justiça.
▶️ Apurações da PF contra Bolsonaro: a corporação suspeita que a fraude nos registros de vacina do ex-presidente e da filha tiveram como objetivo evitar problemas para Bolsonaro entrar nos Estados Unidos.
Bolsonaro deixou o Brasil no dia 30 de dezembro de 2022, dois dias antes do fim do mandato.
Quando deixou o país, Bolsonaro tinha passaporte diplomático.
O jornalista da TV Globo César Tralli apurou, com fontes ligadas à investigação, que o ex-presidente estava receoso de usar o documento, porque não estava em viagem oficial de Estado.
Os interlocutores dizem ainda que suspeitam que Bolsonaro queria uma garantia de que não seria barrado ao tentar entrar nos Estados Unidos por não estar vacinado contra a Covid-19, já que o país exigia a imunização para estrangeiros.
▶️ Autorização para a operação: ao autorizar a operação, o ministro Alexandre de Moraes afirmou ser “plausível” a linha de investigação de que Bolsonaro e seu grupo tenham inserido dados falsos sobre vacina para obter vantagens.
O ministro citou também a possibilidade de existir uma “organização criminosa” para adulterar os dados de vacinação.
Moraes disse, à época, que os indícios de crime eram “relevantes”, e a suposta organização criminosa buscou, além de benefícios pessoais, descredibilizar o sistema de vacinação no país.
De acordo com o ministro, não tem credibilidade a versão de que o ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, tenha inserido os dados falsos sem a autorização do ex-presidente.
▶️ Crimes investigados: segundo a PF, o grupo foi indiciado pelos seguintes crimes:
infração de medida sanitária preventiva;
associação criminosa;
inserção de dados falsos em sistemas de informação;
corrupção de menores.
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Cronologia
Cronologia: as datas citadas na investigação sobre o cartão de vacinação de Bolsonaro
Confira abaixo a cronologia de acontecimentos que envolvem o suposto esquema, de acordo com as investigações.
Janeiro de 2021: O Palácio do Planalto decreta sigilo de até 100 anos ao cartão de vacinação de Jair Bolsonaro.
19 de julho de 2021: suposta aplicação de uma dose da vacina da Janssen em Jair Bolsonaro. O registro é de uma unidade de saúde de São Paulo.
13 de agosto de 2022: suposta aplicação da 1ª dose da Pfizer em Jair Bolsonaro. O registro consta em uma unidade de saúde de Duque de Caxias.
14 de outubro de 2022: suposta aplicação da 2ª dose da Pfizer em Bolsonaro. O registro também é de uma unidade de saúde de Duque de Caxias.
21 de dezembro de 2022: segundo a PF, foi nesta data que as informações sobre a vacinação de Bolsonaro foram incluídas no sistema do Ministério da Saúde. Os dados sobre as aplicações das doses foram incluídos com um minuto de diferença, às 18h59 e 19h.
22 de dezembro de 2022: certificado de vacinação é emitido pelo ConecteSUS na conta de Jair Bolsonaro. O acesso foi feito de uma conexão a partir do Palácio do Planalto.
27 de dezembro de 2022: um novo certificado de vacinação de Bolsonaro é emitido a partir do Planalto. No mesmo dia, as investigações apontam que uma servidora da prefeitura de Duque de Caxias excluiu as informações sobre a vacinação de Bolsonaro do sistema, sob alegação de erro.
30 de dezembro de 2022: certificado de vacinação sem as doses da Pfizer é emitido de um celular do tenente-coronel Mauro Cid. Mais tarde, Jair Bolsonaro embarcou com destino aos Estados Unidos com a esposa e a filha de 12 anos.
17 de fevereiro de 2023: Controladoria-Geral da União (CGU) afirma ter aberto uma investigação após denúncia de “adulteração” do cartão de vacinação de Bolsonaro, em relação à suposta aplicação da vacina da Janssen feita em julho de 2021.
13 de março de 2023: CGU retira sigilo sobre o cartão de vacinação de Bolsonaro.
3 de maio de 2023: PF faz operação, e Bolsonaro diz que não tomou a vacina.
16 de maio de 2023: em depoimento à PF, Bolsonaro reforça que não determinou inserção de dados de vacinação no sistema do Ministério da Saúde.
Setembro de 2023: investigados na operação são soltos, por ordem de Alexandre de Moraes.
Janeiro de 2024: CGU conclui que registro de vacinação de Bolsonaro em SP é falso.

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