O que os depoimentos à PF revelam sobre a participação de Bolsonaro e a reação das Forças Armadas em trama golpista

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Ministro do STF derrubou o sigilo dos depoimentos colhidos no inquérito que apura a suposta tentativa de golpe de Estado para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder. Freire Gomes diz à PF que Bolsonaro participou de negociações que poderiam levar a um golpe de estado
Os depoimentos à Polícia Federal sobre a suposta tentativa de golpe de Estado para manter Jair Bolsonaro no poder após perder as eleições de 2022 revelaram que o ex-presidente teria conduzido reuniões com a cúpula das Forças Armadas para discutir o assunto e apresentar documentos com teor golpista.
O sigilo dos depoimentos de militares e políticos foi derrubado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes nesta sexta-feira (15) sob o argumento de que vários trechos já haviam sido divulgados pela imprensa.
Abaixo, confira como foi a atuação de Bolsonaro, segundo o depoimento dos ex-comandantes das Forças Armadas, e como eles teriam reagido à trama em andamento.
👉 O teor dos textos golpistas
Durante as investigações, a PF encontrou dois documentos que teriam sido discutidos por integrantes do núcleo do governo. Uma minuta de decreto previa a decretação de estado de sítio e outro documento declarava estado de defesa. Veja a diferença entre esses estados de exceção:

📄 o Estado de Defesa é aplicado em locais restritos e determinados para restabelecer a ordem. A decisão é do presidente da República.
📄 o Estado de Sítio é decretado em caso de grave comoção de repercussão nacional; quando as medidas do Estado de Defesa se mostram ineficazes; ou declaração de guerra. O presidente da República precisa antes solicitar autorização ao Congresso.
Minuta golpista apreendida na casa de Anderson Torres
Em janeiro de 2023, a PF encontrou na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres a minuta de um decreto para instaurar estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O documento dizia que o objetivo era apurar suposto abuso de poder e “medidas inconstitucionais e ilegais” tomadas pela então presidência e membros do tribunal. A minuta previa ainda a quebra do sigilo dos ministros e a criação de uma Comissão de Regularidade Eleitoral para investigar os atos do TSE.
Documento encontrado no celular de Mauro Cid e na sede do PL
Em junho de 2023, a PF encontrou um documento no celular de Mauro Cid que sustenta que a ruptura do Estado Democrático de Direito estaria “dentro das quatro linhas da Constituição”. Ao final, o texto declara o estabelecimento de estado de sítio e, posteriormente, uma operação de garantia da lei e da ordem (GLO), que permite ao presidente da República convocar operação militar em graves situações de perturbação da ordem.
Em fevereiro deste ano, a PF encontrou no escritório de Bolsonaro dentro da sede do seu partido, o PL, em Brasília, um documento semelhante ao apreendido no celular de Mauro Cid.
O que diz Bolsonaro sobre os textos: Em diversas ocasiões, ele negou saber sobre qualquer minuta golpista. Em relação ao documento encontrado na sede do PL, a defesa disse que ele recebeu uma versão para que “pudesse tomar conhecimento” do que consta nos autos e a imprimiu para facilitar a leitura.
👉 A ação de Jair Bolsonaro, segundo os depoimentos
Convocado pela PF para prestar depoimento, Bolsonaro recorreu ao direito constitucional de ficar em silêncio e não respondeu às perguntas dos investigadores.
À PF, os comandantes das Forças Armadas relataram que, após as eleições, Bolsonaro chamou a cúpula militar para participar de reuniões sobre articulações para um golpe de Estado.
O ex-comandante do Exército Freire Gomes confirmou que o próprio ex-presidente apresentou uma minuta golpista e discutiu seu teor em, ao menos, duas reuniões.
O então comandante da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, também confirmou ter participado de reuniões em que Bolsonaro apresentou documentos com teor golpista.
👉 A reação dos comandantes das Forças Armadas
Exército
General Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército
Divulgação/Exército
O ex-comandante do Exército Freire Gomes disse que se negou a participar da trama golpista, apesar da forte pressão para aderir à conspiração. Por essa razão, ele passou a ser alvo de ataques de apoiadores do ex-presidente envolvidos no caso.
Ouvido na condição de testemunha, o general disse que sempre deixou claro que o Exército não participaria de nada.
Disse ainda que as medidas propostas com teor golpista não tinham respaldo e que Bolsonaro poderia ser responsabilizado penalmente se as levasse a cabo.
Segundo o ex-chefe da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Jr., que também estava presente nessas reuniões, Freire Gomes chegou a dizer que teria que prender o ex-presidente se ele tentasse consumar o plano golpista.
Ex-comandante da Aeronáutica diz que general ameaçou prender Bolsonaro por plano golpista
Aeronáutica
Novo comandante da Força Aérea Brasileira, tenente-brigadeiro do ar Carlos Baptista Junior
CECOMSAER/Divulgação
Assim como o comandante do Exército, o então comandante da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, disse que relatou a Bolsonaro ser contra as articulações para golpe de Estado e que não toparia participar de nenhum plano golpista. Ele também foi ouvido pela PF como testemunha.
Integrante da Comissão das Forças Armadas que acompanhava as eleições, Baptista Júnior também relatou que o grupo recebeu da cúpula do governo Bolsonaro várias teses de fraudes no sistema eletrônico de votação. No entanto, todas foram rechaçadas pela comissão.
O ex-comandante da Aeronáutica disse ter constantemente alertado Bolsonaro de que não havia fraude na eleição.
Ele também contou que “ouviu” sobre a existência de uma ordem para atrasar a divulgação de um relatório, feito pelo Ministério da Defesa, que atestava a lisura das urnas eletrônicas, nas eleições de 2022.
Marinha
O almirante Almir Garnier Santos foi comandante da Marinha
Reprodução
Então comandante da Marinha, o almirante Almir Garnier, que foi convocado para depor na condição de investigado, ficou calado em seu depoimento à PF.
Ele foi citado por Mauro Cid em sua delação premiada. Segundo Cid, Garnier seria simpático a um golpe de Estado e teria dito a Bolsonaro “que sua tropa estaria pronta para aderir a um chamamento do então presidente”.
O ex-comandante da Aeronáutica também disse que Garnier colocou as tropas que chefiava à disposição de Bolsonaro.

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