Porte de maconha: entenda o voto de Toffoli sobre o tema e quais são os próximos passos

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Ministro Dias Toffoli divergiu dos demais e caberá a Luiz Fux e Cármen Lúcia votarem para decidir sobre o tema. Ministros julgam se porte de drogas para uso pessoal deve ser ilícito administrativo ou penal, e possibilidade de estabelecer uma quantidade para diferenciar usuário de traficante. Ministro Dias Toffoli durante a Sessão Plenária realizada em 20 de junho de 2024.
Andressa Anholete/STF
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), abriu divergência dos demais ministros, nessa quinta-feira (20), e o julgamento que debate os critérios que configuram porte de maconha para uso pessoal permanece sem uma conclusão.
A sessão foi suspensa e caberá aos ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia votarem para decidir o tema. O julgamento será retomado na próxima terça-feira (25).
Em sua manifestação, Toffoli abriu uma nova corrente. Ele votou para manter válido o artigo da Lei de Drogas sobre entorpecentes para consumo próprio. O trecho diz que o porte para uso pessoal será punido com medidas socioeducativas.
Para o ministro, a previsão da lei é aplicável ao usuário de entorpecentes. As sanções, portanto, no voto dele, permanecem.
O ministro argumentou, na manifestação, que após alteração em 2006, a lei retirou os efeitos penais da conduta (veja o que diz a legislação citada mais abaixo). Isso não é consenso no tribunal. Alguns ministros entendem que a lei criminaliza o porte para uso pessoal, ainda que a punição não seja com prisão.
“Crime é toda conduta apenada, sancionada com detenção ou reclusão. E contravenção é toda conduta sancionada com prisão simples. O Artigo 28, ao tratar do usuário, não sanciona nem com prisão, nem com reclusão, e sequer prisão simples. De crime, não se trata. E nem está no capítulo da natureza penal. Portanto, eu não tenho dúvidas de que a lei foi editada com o objetivo de educar os usuários de drogas, tratar os dependentes, e punir os traficantes”, declarou o ministro, em seu voto.
Segundo ele, “classificar o usuário de drogas como criminoso, mesmo que sujeito a penas não privativas de liberdade, contraria o propósito da lei”.
Placar e próximos passos
Com isso, são 5 votos para descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal; 3 para manter o crime punido com pena alternativa e um (de Toffoli) para considerar que a atual lei vigente sobre o tema já não criminaliza.
Na abertura da sessão, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, explicou o que está em jogo.
Barroso detalhou que o ato de consumo de drogas, mesmo que para uso individual, permanecerá como ato ilícito, ainda que seja descriminalizado. Ou seja, continuará contrário a lei, independente de qual seja a decisão do Supremo, mas poderá não ser chamado de crime, se os ministros assim decidirem.
São dois pontos em análise na sessão desta quinta:
Se o porte da droga vai ser considerado um ilícito administrativo ou penal;
Se será possível fixar uma quantidade de droga para diferenciar usuário de traficante. E que quantidade será essa.
Até o momento, há ⁠7 votos para fixar quantias para diferenciar usuário do traficante; e 2 votos para o Congresso ou Anvisa deliberar como será a diferença. Essa maioria já foi formada em ocasiões anteriores.
As propostas de diferenciação do porte e o tráfico são diferentes:
Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber (aposentada) e Alexandre de Moraes defendem que a diferenciação ocorra a partir de 60g;
Edson Fachin avalia que cabe ao Congresso Nacional fixar a quantidade;
Cristiano Zanin e Nunes Marques fixaram a quantidade em 25 g;
André Mendonça votou por 10g (e questionou a natureza do debate, ao afirmar que o STF está passando por cima dos legisladores ao julgar o tema. Veja aqui);
Dias Toffoli se manifestou a favor da Anvisa definir a quantidade.
Efeitos da decisão
O processo tem repercussão geral, ou seja, a decisão tomada pelo tribunal deverá ser aplicada pelas outras instâncias da Justiça em processos com o mesmo tema. Isso vai ocorrer a partir de uma espécie de guia que será elaborado pelos ministros logo após a conclusão da deliberação.
Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, há pelo menos 6.354 processos com casos semelhantes suspensos em instâncias inferiores da Justiça, aguardando uma decisão do tribunal.
STF volta a julgar porte de drogas para consumo próprio
O que diz a Lei das Drogas
A Lei de Drogas, de 2006, estabelece, em seu artigo 28, que é crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal.
No entanto, a legislação não fixa uma pena de prisão para a conduta, mas sim sanções como advertência, prestação de serviços à comunidade e aplicação de medidas educativas (estas duas últimas, pelo prazo máximo de 5 meses).
Ou seja, embora seja um delito, a prática não leva o acusado para prisão. Os processos correm em juizados especiais criminais e a condenação não fica registrada nos antecedentes criminais.
A norma não diz quais são as substâncias classificadas como droga — essa informação é detalhada em um regulamento do Ministério da Saúde.
Além disso, determina que cabe ao juiz avaliar, no caso concreto, se o entorpecente é para uso individual.
Para isso, o magistrado terá de levar em conta os seguintes requisitos: a natureza e a quantidade da substância apreendida, o local e as circunstâncias da apreensão, as circunstâncias sociais e pessoais da pessoa que portava o produto, além de suas condutas e antecedentes.
Ou seja, não há um critério específico de quantidades estabelecido em lei. Com isso, a avaliação fica a cargo da Justiça.
A lei de 2006 substituiu a regra que vigorava desde 1976. Na antiga Lei de Drogas, carregar o produto para uso individual era crime punido com prisão – detenção de 6 meses a dois anos, além de multa.
Diferenças entre descriminalização, despenalização e legalização
Despenalizar significa substituir uma pena de prisão (que restringe a liberdade) por punições de outra natureza (restrições de direitos, por exemplo).
Legalizar é estabelecer uma série de leis que permitem e regulamentam uma conduta. Estas normas organizam a atividade e estabelecem suas condições e restrições – regras de produção, venda, por exemplo. Também pune quem descumpre o que for definido. Na prática, é autorizar por meio de uma regra.
Já descriminalizar consiste em deixar de considerar uma ação como crime. Ou seja, em âmbito penal, a punição deixa de existir. Mas é possível ainda aplicar sanções administrativas ou civis.

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