Sob pressão do Congresso, governo libera R$ 13,7 bi em emendas parlamentares só em abril

Comparação com mesmo período de anos anteriores mostra aceleração nesses repasses em meio a tentativas de manter vetos e aumentar articulação; ministro fala em ‘recorde’. O Palácio do Planalto liberou, só em abril, cerca de R$ 13,7 bilhões em emendas a deputados e senadores. O valor representa mais de 98% da reserva feita para esses recursos desde o início do ano, de R$ 13,88 bilhões.
O governo abriu o cofre em meio a uma tentativa de manter os vetos sobre as emendas parlamentares e aumentar a articulação no Congresso.
Apenas na terça-feira (30), último dia do mês, foram empenhados R$ 4,9 bilhões em emendas parlamentares – mais de um terço do total.
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Na comparação com o mesmo período de anos anteriores, houve uma aceleração desses repasses. No ano passado, o governo havia autorizado apenas R$ 347 milhões até abril (R$ 360 milhões, corrigindo-se pela inflação). Em 2022, último ano de Jair Bolsonaro (PL) na presidência, o valor chegou a R$ 6,11 bilhões no mesmo período – R$ 6,65 bi, também corrigidos.
Em 2021, devido ao atraso na aprovação do orçamento, os empenhos ficaram restritos e não houve repasse de emendas parlamentares até abril. Já em 2020, ano da última eleição municipal, o volume foi de R$ 8,25 bilhões em emendas autorizadas até abril. Esse valor, quando corrigido pela inflação, equivale a R$ 10,55 bilhões.
Na terça-feira (30), o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), publicou um vídeo em uma rede social falando que o valor liberado em 2024 era um “recorde”.
Todos os deputados e senadores têm direito a emendas, que são aqueles recursos que eles usam para bancar obras e projetos em seus redutos eleitorais. Com isso, os parlamentares conseguem ganhar mais capital político entre os eleitores.
O governo, porém, pode ditar o ritmo desses repasses e fazer acenos ao Congresso quando propostas feitas pelo presidente da República precisam avançar. Ou seja, a autorização de emendas é geralmente usada como moeda de troca em votações na Câmara e no Senado.
Integrantes do governo dizem que a alta concentração em abril se deve ao prazo necessário para que os ministérios processem as informações e autorizem os repasses. Por isso, segundo eles, os números foram menores nos três primeiros meses do ano.
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Articulação política
A liberação de emendas é atribuição da Secretaria de Relações Institucionais, ministério que fica instalado no Palácio do Planalto e é comandado por Alexandre Padilha. Ele protagonizou um embate público com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), em abril.
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Padilha também é encarregado de negociar com o Congresso o avanço de pautas de interesse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nas últimas semanas, ele tem tentado costurar um acordo para evitar a derrubada de vetos ligados a emendas.
O risco de derrota em dois vetos fez o governo reagir. Um deles trata de um dispositivo na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que prevê um calendário obrigatório de pagamento de parte das emendas até o dia 30 de junho, data limite para o empenho de emendas antes das eleições municipais.
Como compensação ao veto, em fevereiro, o governo editou um decreto que estabelece um limite de pagamento das emendas mês a mês. Pelo texto, o teto de pagamento, até abril, era de R$ 13,7 bilhões – R$ 11,2 bilhões de emendas impositivas e R$ 2,5 bilhões de emendas de comissão.
Contudo, antes dos últimos empenhos realizados, parlamentares reclamavam que o cronograma proposto pelo próprio Executivo não estava sendo cumprido.
Diante das reclamações, integrantes do governo sinalizaram a deputados e senadores que haveria maior liberação de emendas até a próxima sessão do Congresso, que deve acontecer na semana que vem.
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O próprio Padilha já sinalizou que mais recursos serão reservados ainda no primeiro semestre.
“Vamos continuar trabalhando muito que até o dia 30 de junho é o nosso prazo para você poder repassar recursos para os municípios”, afirmou o ministro no mesmo vídeo publicado na rede social.
Corte nas emendas de comissão
Outro ponto que preocupa o governo é sobre o corte de R$ 5,6 bilhões nas emendas indicadas pelas comissões.
O governo já disse que aceita recompor uma parte desse valor, R$ 3,6 bilhões. Mas ainda há um impasse entre Câmara e Senado na divisão dos valores para cada Casa.
Senadores chegaram a sugerir que o Congresso ficasse com uma fatia dos R$ 15 bilhões que serão abertos a partir de um dispositivo incluído no projeto que recria o seguro para vítimas de acidente de trânsito (DPVAT), caso seja aprovado.
A ideia é que os parlamentares pudessem indicar R$ 3 bilhões de “emendas informais”, recursos que estão nas mãos do Executivo mas que, na prática, são carimbados por deputados e senadores.
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O tema foi levado para uma reunião na última terça-feira (30) entre Padilha e lideranças do Senado, mas governistas afirmam que a discussão não prosperou. Uma reunião com deputados deve acontecer na próxima semana para definir os termos do acordo.
Divisão da verba
Dos R$ 13,88 bilhões empenhados neste ano, quase tudo vai para as emendas de pagamento obrigatório (individuais e de bancada): R$ 13,835 bilhões.
Já as emendas de comissão, que não são obrigatórias, tem por enquanto apenas R$ 44,7 milhões empenhados. O valor autorizado para essa modalidade até o fim do ano é de R$ 11,05 bilhões – e pode aumentar, caso o Congresso derrube o veto aos R$ 5,6 bilhões desses repasses.
Desde o fim do orçamento secreto, que foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a fatia das emendas de comissão tem crescido a cada ano. Esses recursos interessam diretamente à cúpula do Congresso, que tem um poder maior de articulação sobre as indicações feitas nos colegiados.
Até agora, a maior fatia dos recursos já liberados foi para a Saúde: R$ 12,81 bilhões, que representam mais de 90% do empenho total até agora. Em geral, o Ministério da Saúde costuma ser a pasta mais contemplada nesta divisão, já que obrigatoriamente metade das emendas individuais deve ser destinada à saúde.
Os partidos mais beneficiados pelas emendas empenhadas são, em ordem:
PL, que tem a maior bancada da Câmara (R$ 1,825 bilhões);
União Brasil (R$ 1,237 bilhões);
PSD (R$ 1,208 bilhões);
PT (R$ 1,175 bilhões); e
MDB (R$ 1,065 bilhões).
‘Emendas pix’
O governo ainda não empenhou nenhum recurso das emendas de transferência especial – que ficaram conhecidas como “emendas pix”. Mais de R$ 8 bilhões estão autorizados para essa modalidade em 2024.
Criado em 2019, este tipo de emenda ficou conhecido pela dificuldade na fiscalização dos recursos.
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Os valores são transferidos por parlamentares diretamente para estados ou municípios sem a necessidade de apresentação de projeto, convênio ou justificativa – por isso, é difícil fiscalizar qual função o dinheiro terá na ponta.
Como os gestores locais podem escolher como aplicar os recursos, a modalidade ganhou o apelido de “emenda pix”.

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