Tragédia do RS: o que fazer para evitar (ou diminuir o impacto) das doenças

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Enchentes e inundações trazem riscos para a saúde da população. Transmissão ocorre pela ingestão de água ou alimentos contaminados, por contato ou por vetores. Beira do Guaíba mostra enchente em Porto Alegre no dia 8 de maio de 2024
Nelson Almeida/AFP
As fortes chuvas que atingiram — e continuam atingindo — o estado do Rio Grande do Sul provocaram inundações, mortes e afetaram milhões de pessoas. E a enchente, além de destruir casas, vidas e sonhos, traz também riscos para a saúde da população, que vão desde doenças gastrointestinais até infecções e doenças transmitidas por vetores.
Alessandro Pasqualotto, presidente da Sociedade Gaúcha de Infectologia (SBI), explica que a água das enchentes acumula matéria orgânica, com dejetos humanos e fezes de animais. O resultado? Se a pessoa tiver contato com essa água — e na tragédia do Rio Grande do Sul não ter contato é quase impossível — corre um risco maior de adoecer.
“Uma dessas doenças é a leptospirose, que sempre aparece em enchentes. Outra preocupação é que a pessoa faça a ingestão dessa água, o que pode resultar em doenças que causem diarreia e a hepatite A. Tem a raiva, o tétano e outras infecções bacterianas na pele. Nos abrigos também tem o risco de transmissão de doença respiratória, como gripe, covid, tuberculose”, lista o infectologista.
O infectologista Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), destaca que as enchentes trazem risco de doenças por três condições: por ingestão de água ou alimentos contaminados, transmitidas por contato e as transmitidas por vetores (mosquitos).
Apesar de ser uma lista extensa de doenças, o vice-presidente da SBIm pontua que são doenças conhecidas, que têm tratamentos adequados.
Ingestão de água ou alimentos contaminados
O transbordamento de rios e esgotos leva a uma mistura de água limpa e contaminada. Isso aumenta o risco de doenças transmitidas pela água, como a hepatite A, febre tifoide e gastroenterites virais e bacterianas.
“A hepatite A é um vírus transmitido por água e alimentos contaminados. Nessas situações de enchente, onde o saneamento básico é perdido, é comum vermos surtos. A hepatite A é uma inflamação no fígado causada por um vírus, que provoca dor abdominal importante, amarelamento da pele, urina escura e fezes esbranquiçadas”, explica Kfouri.
Pasqualotto ressalta que existe vacina para a hepatite A (leia mais abaixo sobre a recomendação de vacinas), mas nem sempre a pessoa fez a vacinação contra a doença.
A salmonela, bactéria causadora da febre tifoide, também se propaga com muita facilidade nesses ambientes, gerando quadros de vômitos e diarreias.
Imagem de drone mostra ruas alagadas em bairros de Eldorado do Sul (RS)
Reuters/Amanda Perobelli
Transmissão por contato
Nessa lista entra a doença mais associada a enchentes: a leptospirose. A bactéria causadora vem pela urina de ratos e, em contato com a água, a pessoa pode acabar se infectando.
“A bactéria pode entrar no corpo através de ferimentos, de alguma ferida na pele, ou pelas mucosas. É uma doença que causa muito mal-estar, dor no corpo, pode provocar uma inflamação no fígado. Na forma mais grave, com sangramentos, pode levar ao óbito”, alerta Kfouri.
O recomendado, segundo os especialistas, é, na medida do possível, limpar a pele que entrou em contato com a água, lavar muito bem as feridas (se tiver) e observar se o quadro está tendo uma evolução, com pus, inflamações.
Além da leptospirose, é preciso atenção com perfurações e cortes por materiais contaminados, que podem causar o tétano. Vale lembrar que existe vacina para a doença.
Transmissão por vetores
O Brasil vive uma epidemia de dengue e o aumento do nível da água cria condições ideias para proliferação de mosquitos e outros insetos, como o Aedes aegypt, que é responsável também pela zika e chikungunya.
“A enchente nos pegou em um momento de epidemia de dengue. É provável que os casos da doença venham em grande quantidade e por isso é muito importante estar atento aos sintomas”, alerta Pasqualotto.
A população também deve ter atenção com animais peçonhentos (cobras, aranhas e escorpiões) e com a mordida de animais mamíferos que podem transmitir a raiva.
Gripe e Covid
As doenças respiratórias também entram na lista, já que muitas pessoas que foram desalojadas estão em abrigos.
“As pessoas estão muito próximas nesses alojamentos, não tem como fazer distanciamento. Isso facilita a transmissão de gripe e de Covid”, diz Kfouri.
Por isso, é extremamente necessário fazer a vacinação para as duas doenças.
Vacinação é essencial para evitar doenças preveníveis
Divulgação
Vacinação contra doenças preveníveis
Pasqualotto reforça a importância da vacinação neste momento para evitar doenças preveníveis, como gripe, covid, hepatite A e tétano.
“É preciso atualizar o calendário vacinal de quem está em risco. Precisamos vacinas para essas doenças. A vacinação deve ser prioridade e defendemos que seja feita nos abrigos e locais de resgate”, ressalta o infectologista.
Para evitar o desabastecimento no estado, o Ministério da Saúde enviou mais de 300 mil doses extras das vacinas contra tétano, difteria, hepatites A e B, coqueluche, meningite, rotavírus, sarampo, caxumba, rubéola e raiva.
Segundo a pasta, as secretarias de Saúde dos municípios gaúchos estão disponibilizando vacinas nos mais de 700 abrigos que foram montados.
Três sociedades médicas soltaram uma nota técnica com recomendações sobre grupos prioritários que devem receber as vacinas de gripe, Covid-19, hepatite A, tétano e raiva. Assinado pela Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Sociedade Gaúcha de Infectologia (SGI) e Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), o documento lembra que as vacinas de rotina devem ser mantidas conforme disponibilidade de atendimento e imunizantes.
Gripe e Covid-19: socorristas (profissionais e voluntários), pessoas de atendimento em abrigos (profissionais e voluntários), abrigados, desalojados e grupos prioritários para vacinação definidos pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI). Recomendação vale para quem está nesses grupos e que não foi vacinado.
Hepatite A: população dos grupos de risco definidos pelo Centro de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE) que estejam abrigados ou desalojados, socorristas, gestantes de 18 a 40 anos, pessoas de 18 a 40 anos e bloqueio pós-exposição de caso de hepatite A em abrigos. A vacina também está disponível para imunossuprimidos e portadores de doenças crônicas especificadas.
Tétano: socorristas, população resgatada com ferimentos e gestante abrigada.
Raiva: médicos veterinários e técnicos em veterinária, voluntários que estão atuando diretamente com animais resgatados (pré-exposição); casos em que já houve o acidente/agressão (pós-exposição.
Cuidados durante as enchentes (sempre que possível)
Evitar o contato com a água da enchente o máximo possível.
Usar botas de borracha e luvas ao entrar em áreas inundadas.
Lavar as mãos com água e sabão com frequência, especialmente após entrar em contato com água contaminada.
Manter os alimentos e a água potável protegidos da contaminação.
Utilizar repelentes de insetos para prevenir picadas de mosquitos.
Procurar assistência médica imediata em caso de sintomas de doenças, como febre, diarreia ou erupções cutâneas.
Sec. de Saúde de Porto Alegre explica impacto da enchente em hospitais

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